quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Dois caranguejos

Era uma vez dois caranguejos. Um dia, se encontraram na mesma praia. Pensaram em travar um diálogo, mas, com receio que isso parecesse inverossímil, decidiram apenas agir como animais, cabendo aos banhistas interpretar e analisar sua ações animalescas. O primeiro deu dois passos para a esquerda. O segundo pressionou uma garra conta a outra. O primeiro voltou, com um passo para a direita. O segundo deu então três para a esquerda. Perceberam depois disso que ambos eram intelectualmente privilegiados e cogitaram iniciar uma partida de xadrez. O primeiro começou a desenhar o tabuleiro na areia com um graveto enquanto o segundo coletava tampas de garrafa para serem usadas como peças. Começaram o jogo. O Segundo moveu-se primeiro, queria dominar o meio e avançou o peão até a metade do campo. O primeiro moveu-se em seguida, e respondeu com um cavalo em frente ao seu bispo. Fazia um bonito dia de sol na praia enquanto o jogo fluidamente evoluía. O primeiro comeu outro peão com sua rainha, e fez um pequeno comentário sobre como peões eram inúteis porque só se moviam numa única direção. O segundo pensou em contra-atacar com a torre, o que colocaria a rainha em xeque. Mas, assim que pegou na peça com suas grandes garras, parou por um momento, olhou para seu amigo, olhou para a peça, abaixou-a lentamente até sua posição inicial e falou: "Olhe para nós. O que nos diferencia de um peão? Temos andado na mesma direção desde que nascemos. Presos nesse tabuleiro gigantesco que é o mundo. Somos apenas mais uma peça. Invejamos peças maiores tal qual o peão inveja um bispo ou uma torre. E nem ao menos gozamos da esperança de chegar no final do tabuleiro e podermos nos transformar no que quisermos. Sabe o que nos espera no final do tabuleiro? O bico de uma gaivota ou a boca de um homem. Somos piores que peões." Andou lateralmente até o mar, visivelmente abalado pelos pensamentos. O primeiro permanecia parado ao pé do tabuleiro, pensando em tudo que foi dito. Após algum tempo de reflexão, decidiu juntar-se ao amigo. Andou lateralmente até o mar, aproximou-se do amigo e disse: "Pelo menos a gente não come na diagonal". Ambos sorriram, e o sorriso se transformou em risada, e a risada em gargalhada. Riam alto. O segundo riu tanto que caiu de costas na água, o que só intensificou ainda mais as risadas. Nesse momento um banhista caminhava por perto. Apesar de não ouvir muito bem, conseguiu localizar o barulho e voltou seus olhares para a curiosa cena que ocorria na altura de seus pés. Sorriu ao ver os dois caranguejos rindo. O belo jogo de cores entre os cascos alaranjados e o azul esverdeado das ondas do mar deixava a cena ainda melhor. Decidiu eternizar a cena. Era bonita demais para ser só dele.

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